sábado, 21 de abril de 2018

UMA LEMBRANÇA DE SAUDADE (Tony Antunes)


Neste mosaico temos: O Velho Faceta ladeado por sua esposa e pelo grande intelectual palmarense Hermilo Borba Filho, o Estandarte do Maracatu Leão Coroado do Alto do Pascoal, Coco de Roda, Ciranda a Lia de Itamaraca
e as meninas da Rua da Guia
UMA LEMBRANÇA DE SAUDADE
Tony Antunes

Nos meus tempos de criancice vi e vivi nas ruas de Recife. Eu sem pai nem mãe, um andarilhos preso ao asfalto da pobreza e da solidão. Um órfão de amor, carinho e proteção.

Todavia, tive noites insanamente mágicas em que, acolhido por uma cama de papelão (que amenizava a dureza do frio chão) esticado nas noites madrugais da calçada do armazém 17, na beira do cais do Apolo, eu sonhava os mais belos e doces sonhos:

- Uma cama quentinha, uma nova mãe (pois a minha já havia morrido), um pai, quem sabe até uma família? Isto era querer muito!?

Junto com as estrelas, que eram minhas amigas, eu cavalgava em cavalos de nuvens, dragões e pássaros gigantes. Vencia sempre a batalhas contra os cheira-cola. Contra os pivetes do mal. Eu sempre saía ileso. Somente quando acordava é que percebia a realidade. E contra esta é brinquedo não, ela sempre ganha!

Mas (como sempre tem um "mas") tive o privilégio que a maioria dos jovens de hoje nunca tiveram: navegar nas águas do Rio Capibaribe ao som das notas de belíssimas canções. Flutuar nos ares de Recife com desenvoltura em plena Avenida Dantas Barreto, vendo a cara de Nossa Senhora do Carmo rindo para mim.

Ouvi e senti, no corpo e na alma, cada nota melódica no céu do Marco Zero o Maracatu Leão Coroado, Coco de Roda, Ciranda da Lia e, do Velho Faceta, o seu Pastoril Profano com suas "quengas" lindas dos cordões encarnado e azul, todas com suas calcinhas “queimando o arrôi”. Eu preferia o cordão mais safado - o encarnado.

Aprendi amar nos cabarés da Rua Guia. Lugar onde as "putas" tinham muito respeito, e secura, pelos meninos "donzelos" doidos para tirarem o "cabrecho". Eu era um desses tais "tabacudos" afim de furar uma nega daquelas. E consegui. Eu com apenas 17 aninhos e ela com seus suaves e maduros 52. Um filé! Foi um susto da "bichiga", mas que me valeu muito a pena, ah isso sim, valeu!

Me viciei tanto na putaria que virei "xeleléu" de puteiro, num daqueles matadouros do sossego familiar. Eu era o principal responsável por garantir o banho "tcheco" da meninas e dos fregueses. Tinha garantido três refeições por dia, lugar para dormir e, na hora H, um tabaco para brincar! Nunca fui muito de gostar de santa, isso até conhecer uma que me catequizou há 26 anos.

No fim de tudo, tudo se finda com as nossas lembranças dos velhos carnavais, porque tudo na vida passa, de tudo o que já passamos! As únicas coisas que ficam são as alegres e doces lembranças de um tempo em que éramos felizes, mas não sabíamos!

segunda-feira, 2 de abril de 2018

O TRAVESEIRO (Tony Antunes)

“O tempo, devorador, é pródigo em esfumar os significados ou adulterá-los às conveniências. O tempo é despudorado. O tempo começa a dar pequenas notícias que passam. No corpo, no coração.” (in. MARANHA, Vanessa. Começa em mar. São Paulo: Editora Patuá, 2016, p. 147)



RESPEITE-SE OS DIREITOS AUTORAIS: LEI Nº 9610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998